CENA 1: Cristina fica sem resposta diante de Fábio.
-O gato comeu sua língua? Achei que você fosse pelo menos me cumprimentar...
-Fábio... uma coisa de cada vez. Claro que eu fiquei feliz de te ver aqui. Não vou mentir... morro de saudade de nós dois. Mas isso tá errado.
-Eu sei que não deveria ter vindo sem te avisar antes. Mas se eu avisasse, provavelmente você me diria pra não vir.
-Se você sabe a resposta, então você realmente espera que eu te responda isso?
-Nossa... você é realmente direta e reta.
-Fábio... eu te entendo, de verdade. Se dependesse de mim, da minha vontade, eu ia te ver todos os dias. Só que eu pensei que você tivesse entendido o recado no nosso último encontro. Era pra ser um adeus... definitivo.
-É que você foi embora... antes mesmo de eu acordar. Não olhou pra trás. Nem uma carta, nem um bilhete...
-A gente tinha combinado assim. Eu te avisei na noite anterior... que não ia ter nenhuma despedida. Você sabe que eu detesto despedidas. Preferi que fosse assim.
-Mas e o que eu gosto, não conta nisso?
-Claro que conta! Quem é que disse que não conta?
-Você.
-Oi? Acho que não entendi muito bem onde você pretende chegar.
-Você não quis saber se eu gostava ou não de despedidas.
-Mas você teve a oportunidade de falar. A gente conversou muito, sobre tudo. Pensei que você tinha aproveitado a oportunidade pra se abrir, pra fazer e dizer tudo o que queria e precisava.
-Mas eu não disse. Eu senti falta de um último adeus, de uma despedida pra lembrar.
-E você esperava que eu adivinhasse, Fábio? Você não me disse nada disso em momento nenhum.
-Tem razão... o erro foi meu, mas a gente erra tentando acertar.
-De qualquer forma, já foi. Se você tivesse dito antes, eu teria considerado uma despedida como você gostaria de ter. Mas agora não dá... já é tarde demais.
-Você permanece mesmo irredutível, não é? Determinada a me deixar.
-Fábio, nós já conversamos sobre isso. Se dependesse desse sentimento que nos une, não haveria separação. Eu me casaria com você sem pestanejar, inclusive. Mas não posso. Você sabe muito bem os motivos.
-Eu só pensei que a gente podia tentar de novo.
-Pois pensou errado. Chegaram os convites do meu casamento com o Hugo... ficaram prontos. Agora é pra valer, Fábio... por mais simbólico que tudo isso seja, foi nesse momento que me caiu a ficha. Não tem chance de recuo... acabou pra nós. De uma vez por todas.
-Por um momento eu pensei que pelo menos esse casamento poderia ser adiado mais um pouco.
-Adiantaria de alguma coisa? Isso só prolongaria a nossa dor, Fábio. Te ver também aumenta a minha dor. Você sabe que eu te amo, não sabe?
-Sei... e eu também te amo.
-Então, se você me ama, vai ter que me libertar. Da mesma forma que te liberto...
-Isso não é liberdade, Cristina... você não consegue perceber.
-Foi modo de dizer, Fábio. Eu sei muito bem onde tou me metendo.
-Numa prisão. Na pior das prisões.
-Não me julgue... espero tudo de você, menos julgamento.
-Cristina... não cabe a mim te julgar. Mas o que você quer que eu pense? Você tá se prendendo a um homem que não ama.
-Mas eu amo o Hugo, você sabe muito bem de toda a consideração e toda amizade, todo o carinho que eu tenho por ele.
-Mas não é o mesmo amor que existe aqui.
-Não importa mais. Já tá feito... Fábio... por favor, eu não quero uma despedida traumática... vai embora antes que a coisa piore.
-Eu vou... mas antes queria te pedir uma última coisa.
-Peça o que quiser... mas vai embora logo depois. Pode ser?
-Certo. Acho que merecemos um último beijo.
Cristina fica pensativa.
-Certo... o nosso último. Pra guardar na memória... depois disso, é adeus.
Fábio beija Cristina apaixonadamente e deixa a sala. Cristina desaba em prantos. CORTA A CENA.
CENA 2: Guilherme procura Érico no quarto dele.
-Posso entrar?
-Claro que pode, Guilherme...
-Tá se sentindo melhor depois da nossa conversa?
-Melhor eu não sei... menos sozinho, com certeza. Obrigado por ser tão compreensivo...
-Besteira, Érico... não sou tão bom assim, mas agradeço pela generosidade do seu olhar.
-Engraçado, nunca ninguém me disse que meu olhar sobre algo alguém era generoso.
-Mas eu tou dizendo. Fico com a impressão que você não tá acostumado a receber elogios ou ser valorizado pelas pessoas.
-Tenho minhas razões pra isso, Guilherme... você sabe disso.
-Me chama de Gui, por favor. Quando alguém me chama pelo nome, parece que tá me xingando...
-Tudo bem... sabe, Gui... eu tenho meus motivos. Fora da minha casa, o mundo não tem sido muito legal comigo. Já faz muito tempo...
-É por isso que você escolheu a tristeza?
-Não fui eu que escolhi a tristeza. Foi a tristeza que me escolheu. Só me entreguei...
-Não cabe a mim questionar isso... mas você não acha cedo demais pra se entregar? Você só tem vinte anos...
-Mas sinto às vezes como se tivesse oitenta.
-Independente de como você se sinta... você ainda é jovem. Tem muito o que viver. E vai ser feliz, eu aposto.
-Não acredito na felicidade. Ela é uma ilusão, um estado passageiro. Acho mais fácil ser triste perseguindo a felicidade do que desistindo dela...
-Um tanto fatalista a sua visão. Mas não te tiro a razão. Não somos felizes o tempo inteiro... ninguém é.
-Como assim? E as pessoas que eu vejo sempre sorrindo, de bem com a vida?
-Você é ingênuo assim ou tá só se fazendo?
-Ei, não me ofende, tá?
-Não é com intenção de ofensa... você é ingênuo... isso é bonito. Mas pode te machucar. Respondendo à sua pergunta: nem a pessoa mais sorridente do mundo é feliz o tempo todo. Já parou pra pensar que você se entristece justamente porque “inveja” a felicidade aparente dos outros?
-Faz sentido...
-Querido... todo mundo passa por perrengue nessa vida. A vida é tipo uma corda bamba, a gente precisa saber se equilibrar nela. Meus problemas, seus problemas... o que são eles? Tem tanta coisa horrível acontecendo nesse mundo! E mesmo assim essa gente encontra força de reagir, de sorrir, de não desistir. Você tem essa força... só não descobriu, ainda...
CORTA A CENA.
CENA 3: Fábio, na frente da clínica de Cristina, sofre ao constatar que não tem mais chances de viver seu amor ao lado dela. Pensativo, decide pegar o celular e ligar para Elisabete.
-Oi, Bete... incomodo?
-Nunca me incomoda, meu querido. Não somos mais casados, mas somos amigos.
-É isso que me deixa mais consolado. Saber que não sou sozinho.
-Pra que você tá dizendo isso... parece estar triste. Não só pelas palavras... mas pelo seu tom.
-E tou triste. Por tudo. Por ter deixado as coisas chegarem onde chegaram. Por ter sido inconsequente... eu assumi o risco. E agora não sei se consigo lidar com as consequências óbvias disso.
-Ela te largou de vez, não foi?
-Foi.
-Eu sabia que isso ia acontecer. Esse encontro de vocês aconteceu na hora errada. Tanto pra você, quanto pra ela. Você ainda se refazendo do luto pela morte da Arlete e nem adianta me negar porque eu sei que sim, ela assumindo bravamente as consequências dos próprios erros. Tudo isso era previsível. Com o agravante de que você, sem querer, mentiu pra ela. Pensa que no fim das contas foi melhor assim... que ela vai guardar pelo menos uma lembrança boa de você, sem saber dessa mentira que você contou.
-Não menti porque quis... mas tive medo da reação dela se soubesse que eu ia casar com a Arlete... não importa mais... nos perdemos de qualquer forma. Talvez nem tenhamos nos perdido... nunca tivemos um ao outro, de verdade. Na verdade, o erro foi meu de me envolver com uma mulher prestes a se casar...
-Exatamente. Você está sendo lúcido... sei que dói, que não é fácil. Eu, mais que ninguém, sei o tanto que ainda me dói ter de abrir mão de algo que eu quis mais que tudo nessa vida que desse certo.
-Você consegue me entender, ainda... apesar de tudo o que eu fiz.
-Deixa disso, Fábio... a maior culpada de te prender fui eu. Ei, você não quer almoçar comigo? Conversar um pouco, esquecer um pouco desse clima pesado... topa?
-Eu topo. Mas só se você não tapar os ouvidos e sair correndo a cada vez que eu falar da Cristina...
-Até parece... vem que eu já vou encomendar a comida indiana naquele delivery...
-Tá certo. A gente se vê daqui a pouco. Beijo.
CORTA A CENA.
CENA 4: Flavinho está andando pela clínica quando escuta gargalhadas de crianças.
-Que gostoso ouvir o riso dessas crianças... lembra quando eu conheci o Leonardo... - murmura Flavinho, consigo mesmo.
Flavinho acaba sendo atraído ao quarto de onde vem as gargalhadas e encontra Gustavo com nariz de palhaço a alegrar as crianças.
-Não é possível... - fala Flavinho.
Gustavo escuta e percebe que Flavinho está ali.
-Que bom que você apareceu, Flavinho! Tá olhando a Isabela ali no canto? Ela anda tão tristinha, mal abriu sorriso hoje, acredita? - fala Gustavo.
Flavinho permanece perplexo.
-Tá tudo bem, Flavinho? Ocê tá com uma cara de quem viu assombração...
-De certa forma foi quase isso, Gustavo. Eu não sabia que você animava as crianças assim. Me fez lembrar o dia que eu conheci o Leo...
-Eu sinto muito. Não sabia que isso podia te fazer sofrer... desculpa.
-Desculpa pelo que, criatura? Você não acabou de dizer que a Isabela tá precisando sorrir mais? Então bora fazer essa princesa sorrir, não é mesmo?
Flavinho se junta a Gustavo. CORTA A CENA.
CENA 5: Hugo permanece tentando se focar em seu trabalho, mas não consegue. Giovanna percebe.
-Posso te ajudar, Hugo? Eu sei que você mandou eu ficar quieta, mas tá na cara que você não anda conseguindo se concentrar...
-Não tou conseguindo mesmo, Giovanna. Acho que te devo desculpas.
-Desculpas pelo que? Tá, é verdade, você foi grosso comigo... mas isso já passou. Somos ou não somos livres?
-Você me intriga às vezes, sabia?
-Por que? Não vejo razão. Sou clara e cristalina com você... há doze anos.
-Mas não é honesta com os outros...
-Olha cara, se for pra começar essa palhaçada de me apontar o dedo depois de tanto tempo, eu te deixo falando sozinho aqui, valeu?
-Não... não é isso. É que ando questionando uma série de coisas.
-Sei. E por acaso, dentre essas coisas, estou eu?
-Não sei. Acho que o casamento com a Cristina pode ser um erro.
-Como é que é, Hugo? Você não lembra do que a gente combinou? Do que a gente planejou? Caramba!
-Eu planejei alguma coisa? Você planejou tudo... e sabe disso, Giovanna.
-Onde você quer chegar com essas voltas?
-Não sei se quero casar. Mesmo.
-Hugo, presta atenção: tudo isso vem sendo combinado e arranjado há muito tempo. Você concordou com tudo. Vai dar pra trás agora?
-Não sei se é uma boa ideia, sinceramente. Nem se é justo.
-Claro que é uma boa ideia, evidente que é justo! Ninguém melhor que a Cristina pra ser sua mulher...
-Por que você faz tanta questão que meu casamento seja com ela? O que te motiva?
-Pensei que você soubesse... sempre expliquei isso claramente. Assim, eu continuo sendo a outra. Fico com a melhor parte de você.
-Partindo dessa premissa, eu poderia me casar com qualquer uma. Por que você insiste nela?
-Porque vocês não se amam.
-Como é que é?
-Já falei demais. Agora, eu preciso resolver umas coisas ali na redação da revista...
Hugo fica intrigado. CORTA A CENA.
CENA 6: Cristina chega em casa e encontra Daniella na sala.
-Oi, mana... a mãe e o pai já foram dormir?
-Devem estar no vigésimo quinto sono agora... menina, sabe quem esteve aqui pra falar comigo?
-Vish, pela sua expressão de quem descobriu a roda, só pode ser a Madame Marie...
-Ela mesma. Cris, ela me falou umas coisas... que fiquei até besta. Coisas que obviamente ela não tinha como saber porque eu não tinha dito nada...
-Não sei porque você ainda se impressiona. Faz tempo que eu sei que ela é porreta. E ainda não cobra nada, a danada...
-Nem precisa, né... a mulher é mais rica que a gente...
-E faz tudo na humildade. Essa é a diferença dos sensitivos de verdade em relação aos charlatães.
-Mas chega de falar nisso... tou notando você meio aérea... um pouco fora de órbita.
-Dani... se eu te contar, você não fala pra mais ninguém?
-Sério mesmo que você me pergunta isso, Cristina? Até parece que não me conhece a uma vida inteira... vai em frente, mana...
-O Fábio me procurou... disse que sentiu falta de uma despedida.
-E aconteceu essa despedida?
-Sim. Nos beijamos... foi um adeus bonito, mas triste.
-Não precisava ser um adeus, se você não quisesse.
-Nesse momento, nada disso mais depende de mim.
-Porque você permitiu que as coisas chegassem a esse ponto... mas enfim... e o Vitório? Pelo visto você nem lembra dele...
-Eu lembro... mas é isso que ele se tornou, Dani... só uma lembrança.
-E você sabe que quem promoveu essa mudança foi o Fábio, não sabe?
-Claro que sei. Nunca amei ninguém como eu amo o Fábio...
-Ainda dá tempo, mana...
-De que?
-De desistir do seu casamento com o Hugo...
-Não, Dani... isso tá fora de cogitação.
-Você que sabe. Mas depois, não vá se arrepender...
CORTA A CENA.
CENA 7: Flavinho entra no quarto de Valéria sem bater.
-Ai, menino, que susto! Custava bater na porta antes? Quase botei o coração pela boca, achando que podia ser assaltante!
-Desculpa, Valéria... mas é que ainda tou maravilhado com um trem que eu descobri.
-Vish... dá pra ver. Tem a ver com o trabalho lá na clínica?
-Tem... e adivinha quem é o dono da surpresa?
-Surpresa? Uai, que papo mais esquisito, esse daí...
-O seu irmão!
-O que tem o Gustavo?
-Menina, ocê acredita que ele anima as crianças se fantasiando e fazendo palhaçada? Igualzinho ao que o Leo fazia... foi lindo de ver! Você sabia disso?
-Não sabia... mas não fico surpresa. Mas... ocê não acha que tá empolgadinho demais por descobrir isso?
-Não entendi...
-Pres'tenção no jeito que ocê chegou aqui, com um sorriso de orelha a orelha, com os olhos brilhando... acho que ocê tá misturando as coisas...
-Quem, eu? Ai, Valéria... não viaja, na boa.
-Uai, mas não é ocê que fica forçando a barra pra me juntar com o Hugo?
-Que bandida, você! Tá de vingancinha, é?
-Tava só esperando o momento apropriado pra isso, não vou mentir...
Os dois se divertem. CORTA A CENA.
CENA 8: Humberto estranha indiferença de Armênia antes de dormir.
-Não te entendo, amor... faz dias que a gente não se encontra na cama...
-E você acha que eu tenho cabeça pra pensar em sexo, Humberto? Em que mundo você vive? Por sua culpa, por culpa do seu conservadorismo, nosso filho tá fora dessa casa, pra não perder a sanidade. Se você acha isso pouco, eu realmente não sei mais o que te dizer.
-Mas Armênia... você sabe que sempre fui de direita. Minha criação foi conservadora. Isso é assim, sempre foi. As minhas opiniões ninguém vai mudar.
-O meu erro foi ter acreditado que eu podia te tornar uma pessoa melhor com o tempo. Não deu. Tive esperança quando nosso filho saiu do armário... mais uma vez, dei com os burros nágua. Cansei... tenho me cansado há muito tempo.
-Você quer se separar, é isso mesmo que eu entendi?
-Ainda não. Mas tou a ponto de pensar nisso mais seriamente. Vinte e cinco anos dando murro em ponta de faca, pra que? Pra gente chegar nas bodas de prata desse jeito?
-Mas eu sou assim... não vou mudar.
-Então vai chegar o dia que a nossa separação vai ser inevitável. Eu não vou aguentar isso a vida toda. Ou você muda, mas muda de verdade, de coração, ou acabou pra gente. E eu tenho certeza que o Guilherme também não faria questão de olhar pra sua cara.
Humberto fica pensativo. CORTA A CENA.
CENA 9: Cristina insiste em conversar com Daniella sobre Gustavo.
-Mana, eu sei que você não quis entrar em maiores detalhes do papo com a Madame... mas tenho certeza que ela falou muito sobre o Gustavo.
-Falou... a questão é que eu não sei mais o que fazer. Eu caguei com ele. De um jeito que não devia.
-Quem sabe se você engolir esse seu orgulho leonino, você consegue se acertar com ele... já pensou nisso?
-Orgulho? Mas eu já cansei de pedir desculpa pra ele!
-Mas não reconheceu que foi orgulhosa e que agiu como dona da verdade, julgando ele. Talvez seja só isso que esteja faltando pra vocês se acertarem outra vez.
-Você acha?
-Tenho certeza.
-Bem... eu vou ver o que eu posso fazer.
-Não perde muito tempo pensando, não... vai e faz o que é preciso fazer. Sem questionar.
Daniella fica pensativa. CORTA A CENA.
CENA 10: Daniella vai para seu quarto. Ainda pensativa, pega seu celular.
-Será que eu ligo pra ele? Ele pode ter ido dormir já... chega cansadíssimo do trabalho... bem, mas se eu não ligar agora, talvez depois eu perca a coragem...
Daniella decide ligar para Gustavo.
-Você me ligando agora? Tá tudo bem, Daniella?
-Sim, nenhuma tragédia até aqui. Liguei porque precisava ouvir sua voz.
-Dani... não faz assim... respeita meu tempo.
-Eu quero te ver. Te pedir desculpas por ter sido orgulhosa e dona da verdade com você. Eu sei que a hora é péssima, mas se eu não te disser tudo isso pessoalmente, eu morro.
Gustavo fica pensativo. Daniella aguarda com ansiedade pela resposta dele. FIM DO CAPÍTULO 40.
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