CENA 1: Nicole tenta explicar conversa a Sérgio.
-Não é bem assim, Sérgio... você deve ter entendido errado. - fala Nicole.
-Eu entendi perfeitamente. Escutei o que vocês conversaram. Não precisam me esconder nada. - devolve Sérgio.
-Bem... eu vou deixar vocês conversarem melhor sobre isso... prefiro não me meter, pra não influenciar. - sentencia Nicole, se retirando.
Sérgio senta no sofá e olha Cristina, que está apavorada.
-Ei, minha menina... pra que essa cara de pavor? Parece que você tem medo que eu te bata... eu não vou fazer isso. Nunca fiz!
-Pai... não me julga. Essa situação saiu do meu controle.
-Filha... você já é adulta o suficiente pra compreender que as coisas não são assim... que raramente alguma coisa realmente está no alcance do nosso controle.
-O que? Pai, você me falando essas coisas? O que aconteceu com você? Quando eu fugi com o Vitório você ficou todo sentido, quase cortou relações comigo, chegou a negar que eu era sua filha... o que mudou?
-Filha... nada mudou. O que talvez tenha se modificado sensivelmente foi a compreensão das coisas. A certeza de que independente de laços e convenções, cada pessoa é independente.
-Nunca esperei ouvir isso de você... sinceramente, não sei se fico surpresa, perplexa ou mesmo se fico feliz. Acho que fico feliz, né? Só que... ainda assim, pai: não é simples como parece. Eu gosto do Hugo. Tenho uma consideração e amizade imensas por ele.
-Mas não ama. Ama?
-Não... quer dizer... amar, eu amo. Amo o amigo, o confidente, o parceiro maravilhoso que ele é. Mas...
-Não precisa ter receio de me dizer, filha. Você não o ama como homem.
-É isso, pai... eu tentei. Faz quase três anos que eu tento... mas não consigo.
-Então não é momento de reconsiderar se vale realmente a pena entrar nesse casamento?
-O que? Juro que nunca nessa vida pensei que ia viver pra ver o dia que você, seu Sérgio, ia me dizer isso. As coisas realmente estão diferentes...
-Pra melhor, espero.
-Claro... isso é certo. Mas as coisas tomaram uma proporção que eu não posso mais simplesmente largar tudo.
-E por que não?
-Você deveria saber melhor que eu, pai. Vocês são amigos da Bernadete e do Leopoldo faz uma vida... passaram quase vinte anos sem contato e eu não tenho o direito de colocar a amizade e a camaradagem que existe entre vocês em risco.
-Filha... presta atenção: a amizade que eu e sua mãe temos com eles é mais forte e mais sólida que qualquer incidente envolvendo você e o filho deles. Pensa nisso...
-E se eles não pensarem assim, como fica? Vocês ainda podem sair queimados dessa história e por minha culpa. Já fui inconsequente uma vez. Não posso me dar ao luxo de ser outra vez.
-E viver infeliz sabendo que você abriu mão de um amor? Filha... você é jovem. Tem tempo de refazer sua vida. Tem certeza que vai mesmo jogar tudo isso fora em nome das convenções? Cadê o seu atrevimento, a sua independência, a sua força? Você nunca foi disso. Do seu jeito, você sempre bateu de frente comigo, quando eu era mais preso a tudo isso. Eu aprendo todos os dias com você e sua irmã...
-Só que tudo isso cansa, pai... de verdade. Eu fico emocionada, feliz de verdade por saber que você se melhorou tanto por ser humilde, reconhecer que a gente aprende com todo mundo nessa vida. Mas isso não é suficiente... as pessoas não vão mudar do dia pra noite. Você mudou... mas o mundo, ainda não.
-E desde quando você deu tanta importância pra aprovação dos outros? Nunca vi tanta preocupação com reputação, vindo de você.
-As coisas mudam, pai. Nem sempre pra melhor... eu não devia ter errado tanto quanto errei.
-Não, filha... você não deveria é se culpar por ser humana... pensa nisso, viu?
CORTA A CENA.
CENA 2: Hugo chega em casa e vai direto ao seu quarto. Valéria fica intrigada com o horário e vai atrás dele.
-Ué... chegando mais cedo de novo, Hugo?
-Sim, Valéria. Ando bem de saco cheio de olhar pra cara da Giovanna me comendo com os olhos na agência.
-Eita... mas essa mulher realmente não consegue dar jeito de largar do seu pé, hein? Que obsessão...
-Nem me fala, Valéria. Mais que nunca isso tá me sufocando.
-Bem... eu não tenho realmente nada a ver com isso... mas se isso chegou a esse ponto, foi porque você deixou.
-E foi mesmo, Valéria. Pode me dizer exatamente o que cê pensa porque é bem isso.
-Mas ocê não vê um jeito de sair disso tudo? Não é possível que não tenha uma maneira de escapar dela. Disso tudo, entende?
-Depois de doze anos? Eu nem sei como eu faço pra me virar sozinho...
-Ela fez questão de te fazer dependente, não fez? Você tá perdido... não consegue nem saber o que é... ou o que quer.
-Exatamente. Isso me deixa triste. Eu nunca percebi nesses anos todos o quanto eu sou sozinho.
-Mas você não é sozinho, Hugo... pode ter sido por um tempo. Só que a vida tem esses caminhos tortos, né... é como diz aquele ditado, que Deus escreve certo por linhas tortas. Desse jeito meio atravessado, hoje ocê tem ao Flavinho.
-E a você, não?
-Detesto admitir isso. Nem devia me meter nos seus problemas... porque não são da minha conta. Mas, sim... você também tem a mim. Você não é sozinho, viu? Não mais.
-O duro é tirar de dentro de mim mesmo essa sensação de abandono, de solidão. É horrível se sentir só mesmo cercado de gente. Todo mundo dando tapinha nas costas, fingindo se importar. Ninguém se importa.
-Eu me importo, Hugo. Já deu pra ver que apesar dos seus erros e cafajestagens, ocê é um cara bom... só não sabe disso, ainda. Você mesmo se maltrata... pra mim isso é bem claro. Se sente responsável por mais coisas que deveria se sentir. Ói... desculpa pelo que vou dizer, mas essa solidão, essa sensação ruim que tá brotando aí dentro d'ocê, foi um trem que ocê mesmo colocou aí dentro.
-Como assim, Valéria?
-Simples... você cavou esse buraco. Se colocou dentro dele.
-E como eu faço pra sair?
-Ah, Hugo... se foi ocê que fez isso com as próprias mãos... quem é que pode saber como sair?
-Eu mesmo...
-Exatamente. Ói... eu preciso resolver umas coisinhas ainda, a gente conversa mais depois, viu? Vê se pega leve com ocê mesmo, viu? Essa coisa de remoer culpa não vai ajudar nada.
CORTA A CENA.
CENA 3: José vai à casa de Maria Susana pegar alguns pertences seus que deixou.
-Cheguei em uma boa hora?
-Melhor impossível. Fiz aquele suflê de espinafre que você sempre gostou, olha a coincidência...
-Não brinca... eu posso comer um pouco?
-Por favor, Zé... você deve!
-Sabe... é estranho ainda pra mim vir aqui, sabendo que a gente não é mais marido e mulher...
-Mas ainda somos amigos, não? Pelo menos, no que depender de mim.
-E no que depender de mim, também. Só que é estranho... tudo isso, sabe?
-Não vou mentir dizendo que tou zerada de mágoas e tratando tudo com a maior naturalidade do mundo... porque não estou. Mas sabe de uma coisa? Era assim que as coisas tinham que ser, no final das contas.
-É, mas eu não precisava ser ignorante do jeito que fui...
-Já é passado. A gente não pode mudar o que passou. Mas podemos mudar o futuro se fizermos do agora um lugar diferente do que foi o passado.
-Depois... eu sempre vou ser pai do Miguel.
-Não é? E ele te ama demais, você sabe disso. Você sempre vai ser o herói dele.
-É... isso, até chegar na adolescência. Aposto que ele vai ver o homem falho que eu sou... e vai se decepcionar.
-Ele não precisa ter motivos pra se decepcionar com você, José... se você aprender a fazer a diferença agora.
-Engraçado... isso que você disse agora lembra os papos que tenho com a Idina...
-Então ela é uma excelente companhia pra você. Aliás... alguma coisa me diz que vocês podem acabar tendo alguma coisa... e não demora.
-Tira isso da cabeça, Susi... eu não sei se é o momento.
-Você tá vivo. Eu também tou... a vida não espera pra sempre. Nosso casamento já era... você tem que se permitir... eu vou fazer o mesmo quando me sentir pronta.
-Não esperava que você fosse me dizer isso.
-Você não me conhece completamente. Isso é bom... eu sou a favor da felicidade, do amor... seja como e onde for.
-Você não existe, Maria Susana...
-Existo, sim. Sabe, Zé... apesar de tudo eu tenho um carinho imenso por você. Não quero que a gente se afaste, nunca. Nem o Miguel haveria de querer isso.
Os dois seguem conversando. CORTA A CENA.
CENA 4: Daniella conversa com Valéria no pátio da mansão dos di Fiori.
-Desculpa ter atrapalhado suas coisas, Valéria.
-Atrapalhar o que, cunhadinha? Eu tava só tentando aprender a tricotar. E fui bem mal, acredite. Ocê tá com uma cara de que aconteceu alguma coisa...
-E aconteceu. Acho que fiz besteira com seu irmão.
-Não vai dizer que mais uma vez a Patrícia meteu pilha errada...
-Não sei se foi a intenção dela. Mas acabou que a presença dela causou um problema entre eu e o Gustavo.
-Que tipo de problema?
-Eu gosto da Patrícia... ela me passa a impressão de ser gente boa.
-A mim também passou. Fui amiga dela... mas não se deixe enganar, Daniella... ela não é bem o que demonstra ser.
-Mas até aí, seu irmão também esconde o jogo.
-E não é porque ele quer... ele não pode abrir tudo.
-Eu desconfio que ele tenha sido abusivo com a Patrícia.
-Bebeu veneno pra barata, Dani? Desculpa falar, mas o Gustavo pode ser tudo nessa vida, menos uma pessoa abusiva...
-E o que você sabe sobre a Patrícia, sobre o fim do relacionamento dela com o seu irmão?
-Muita coisa... aliás, eu sei de tudo. Detalhe por detalhe.
-Então me fala, Valéria...
-Eu queria falar... só que não posso. Por consideração e respeito ao meu irmão. Não posso trair a confiança do Gustavo, por mais que seja você... por mais que eu adore ter você como cunhada.
-Tem alguma coisa a ver com a bissexualidade dele?
-Oi? Ele te falou que é bi?
-Precisa dizer? Ele não me disse nada... mas eu sei que o Gustavo gosta de meninos e meninas. Sou de boa com isso.
-Digamos que tenha um pouco a ver com isso...
-Então a Patrícia não reagiu bem a isso... por isso!
-Não vou confirmar nada, Dani... desiste.
-Só pode ser isso... por isso que ela gosta de mim. Eu sou mulher... o que ela não deve admitir é que ele possa se apaixonar por um cara...
-Cunhadinha... não insiste nessa conversa, por favor. Eu não vou te confirmar nada...
CORTA A CENA.
CENA 5: Érico desabafa com Margarida sobre acontecimentos recentes envolvendo o preconceito das pessoas com seu estilo.
-Às vezes eu fico cansado de remar contra a maré, mãe...
-Não tou te entendendo, Érico... você sempre deu um jeito de ser quem você é, não importam os outros...
-Mas quem te disse que eu não me importo? Eu não pedi pra ser insultado, xingado, ridicularizado, agredido e ameaçado pelas pessoas. Eu não quero incomodar as pessoas... mas as pessoas se incomodam mesmo assim.
-Meu filho... não se entrega! Você chegou até aqui... vinte anos de resistência pode parecer pouco pra quem olha de fora, mas é uma marca invejável pra qualquer um. Você é mais forte do que pode ver ou imaginar, nunca duvide disso. Não é pra qualquer um, assumir cada detalhe seu e dar a cara pra bater.
-É, mas quem disse que eu quero apanhar?
-Eu entendo, Érico... mas não sei mais o que posso fazer ou dizer pra melhorar as coisas...
-Tá vendo, mãe? Eu canso todo mundo... até você.
-Isso não é verdade. Só que eu me sinto meio impotente diante dessas coisas. Nós não temos controle sobre isso... o máximo que posso fazer é te apoiar sempre.
-Eu agradeço por isso, mãe... você não faz ideia do quanto isso significa pra mim... ainda mais que nunca tive um pai. Mas nunca senti falta, também.
-Filho, porque você não se aproxima do Guilherme? Aproveita que ele tá passando uns dias aqui...
-O que, me aproximar daquele almofadinha?
-Quem te disse que ele é almofadinha? Logo você julgando uma pessoa pelo estilo? Não te reconheço mais, Érico... ou será que você tá se defendendo demais?
-Eu não sei... mas olha bem pro Guilherme, mãe! Todo certinho... dorme nos horários certos, parece que tá treinando pra ser santo.
-Pois você se engana redondamente em relação a ele. Ele ajuda muita gente. Muito mais do que você imagina. Tá sempre aconselhando, apoiando, fazendo o possível para melhorar a autoestima das pessoas. Pensa nisso com carinho, viu? Ele pode ser um bom amigo...
-Vou pensar, mãe... mas não te garanto nada.
CORTA A CENA.
CENA 6: No dia seguinte, Gustavo e Daniella se encontram numa lanchonete.
-Demorou pra chegar, hein?
-Desculpa, Gustavo... acabei perdendo tempo decidindo o que eu ia vestir.
-Em pleno domingo de natal? Bem... quem sou eu pra te julgar, né? Não acho que precisasse de tudo isso.
-Você tá estranho... parece seco comigo.
-E você esperava o que, depois daquela noite?
-Olha, amor... eu sei que eu errei com você. Conversei com a sua irmã a respeito... ela me garantiu que minhas suspeitas não tinham fundamento.
-Sabe qual é o problema? É justamente esse: você pensar coisa errada de mim... fazer esse juízo a meu respeito.
-Mas eu já disse que me arrependo de ter pensado besteira. Não fiz por mal... você precisa entender que eu tenho os meus motivos.
-Você falou bem: são os seus motivos. As suas coisas. Eu não podia ser colocado nisso, não desse jeito.
-A gente precisa encontrar uma solução pra tudo isso, Gustavo... do jeito que tá, não pode continuar.
-Tem razão... você antes me pediu um tempo. Quem tá te pedindo um tempo agora, sou eu.
-O que? Mas você não me ama?
-É claro que te amo!
-Então por que isso agora?
-Dani... você não tem dimensão das coisas? Do quanto me ofendeu suspeitar de mim? Falar aquelas barbaridades depois do jantar? Tudo isso doeu fundo em mim. Eu preciso de um tempo pra sarar dessa dor que você causou. Você me decepcionou, Daniella.
-Não vou te recriminar. Você tá no seu direito. Só espero que a gente possa ser capaz de superar esse momento.
-Vai depender de você...
Daniella chora, conformando-se com o tempo proposto por Gustavo.
CORTA A CENA.
CENA 7: Flavinho percebe que Valéria está distante.
-Alô, Valéria... planeta Terra chamando Valéria!
-Ai, o que foi, Flavinho? Tava quieta aqui no meu canto, eu hein...
-Quieta você pode estar... mas aqui, com certeza não.
-Dá pra notar? A minha cabeça anda longe, pensando as coisas ao mesmo tempo.
-O que, por exemplo?
-Essa situação toda do Hugo, coitado. Dá pena de ver um homem que tinha tudo pra estar feito na vida assim, tão perdido...
-Oi? O que tá pegando aqui que eu perdi, Valéria?
-Uai, tá pegando nada, não...
-Nunca pensei que ia viver pra ver você dizer que tá com pena do Hugo.
-O que é que tem? Ele também é meu amigo, uai. Não sei porque ocê tá pra cima de mim com esse assombro todo.
-Ocê tá pensando nisso, mais do que o normal.
-Seja mais direto, Flavinho. Sem paciência pra pegadinha psicológica agora.
-Simples: você tá se apaixonando por ele.
Valéria explode com Flavinho.
-Chega dessa palhaçada. Te proíbo de falar esse troço na minha frente. Sai daqui, Flavinho, me deixa em paz! Agora!
Flavinho se espanta com o grito de Valéria.
-Ocê nunca gritou comigo...
-Mas gritei agora... esse seu papinho me tira do sério.
-Mais uma razão pra eu ter certeza do que tou falando. E antes que ocê grite comigo de novo, vazei!
CORTA A CENA.
CENA 8: Cristina descansa vendo TV em seu quarto e se flagra pensando em Fábio e nos momentos que passou com ele.
-Será que eu ligo pra ele? - fala Cristina, consigo mesma.
Cristina pega seu celular e está prestes a discar para Fábio, porém larga o celular em sua cama.
-Melhor não. Nenhum de nós tá podendo alimentar isso... nem agora, nem nunca.
CORTA A CENA.
CENA 9: Bernadete percebe que Flavinho está abalado.
-O que foi, querido?
-A Valéria gritou comigo. Isso nunca aconteceu antes...
-Não fica assim, querido... um dia você vai encontrar uma mulher que não vai fazer você passar por isso.
-Oi? Do que ocê tá falando, Bernadete?
-Eu sei que você pode achar besteira o que eu vou dizer... mas eu testemunhei a transformação que meu filho viveu.
-Não tou entendendo...
-Ele teve essas dúvidas que você teve. Mas acabou colocando a cabeça e o coração no lugar... tanto que a Valéria tá aí esperando um filho dele...
-A senhora me desculpe, mas eu não tenho dúvida nenhuma do que eu sou. Se me dá licença, eu vou subir.
Flavinho sobe as escadas atordoado pelas palavras de Bernadete. CORTA A CENA.
CENA 10: Horas depois, Valéria flagra Hugo chorando no quintal e se compadece dele, dando-lhe um abraço.
-Nossa, Valéria... você não faz ideia de como eu precisava de um abraço agora...
-Eu sei, Hugo. Também sinto falta disso às vezes. Sabe, eu passei por muito perrengue nesses últimos tempos. Eu achava que o William era o amor da minha vida, ele me acusou de golpista quando fiquei grávida, mas era ele que mentia que era pobre pra mim. E acontece essa tragédia com seu irmão, esse mal entendido todo...
Hugo se sente atraído por Valéria, que também se sente atraída por ele. Os dois acabam não resistindo e se beijam. Valéria inicialmente corresponde, mas logo recua, assustada. FIM DO CAPÍTULO 36.
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