terça-feira, 24 de janeiro de 2017

CAPÍTULO 62

CENA 1: Cristina mal tem tempo de se sentir mais calma enquanto espera, quando vê que a segunda linha começa a aparecer no exame.
-Não pode ser... não agora. Não desse jeito! Esse exame pode estar errando... e ainda nem passou os dois minutos...
Poucos instantes depois, a segunda linha se confirma e Cristina se desespera.
-Meu Deus... o Fábio fora daqui e eu esperando um filho ou filha dele...
Cristina olha para o vazio sem saber o que fazer.
-Eu preciso dar um jeito nisso. Ninguém vai fazer isso por mim...
Nicole bate na porta do banheiro.
-Filha, cê tá bem?
-Claro que tou, mãe... o que foi agora?
-Nossa Cristina, precisa ser grossa assim? Não posso me preocupar, não?
-Se preocupar ou vir catar o que eu vim fazer?
-Filha, eu te vi correr pro banheiro com pressa. Achei esquisito. Estranhei sua demora. Só quero saber se tá tudo bem, nada além disso.
Cristina resolve abrir a porta. Nicole percebe expressão da filha.
-Que cara é essa de quem viu assombração?
-Mãe... eu realmente tou grávida. Acabei de confirmar.
-Não chega a ser uma surpresa pra mim, filha... e eu confesso que até me alegra a ideia de que eu vou ser avó...
-Mas e eu, mãe? E eu? Como é que eu fico nisso? Não que eu não queira ser mãe, longe de mim, mas...
-Filha... desculpa perguntar, mas depois de um certo tempo você resolveu encaretar ou eu tou vendo coisa onde não tem?
-Encaretar, eu? Jamais, dona Nicole... jamais!
-Não é o que parece. A sua preocupação é pela gravidez ou pelo fato de o pai do bebê estar fora daqui?
-É que eu nunca pensei que as coisas iam acontecer desse jeito na minha vida...
-Mas é assim que as coisas aconteceram. O que foi não dá pra ser mudado...
-O duro é saber o que fazer daqui pra frente.
-Você pensa em falar com ele?
-De jeito nenhum! E você tá proibida de contar a ele, mãe!
-Como que eu contaria, se nem tenho o contato dele?
-Mas eu bem sei que quando você quer, dá seu jeito de conseguir...
-Eu não faria isso com você, filha...
-Eu ainda não sei o que fazer. Mas vou manter essa gravidez. Independente das atribulações, eu quero ser mãe... e considero que esse talvez seja um bom momento. Só que o Fábio não precisa saber disso.
-Um dia ele vai precisar saber. Ele é o pai.
-Um dia... mas até lá, esse bebê é produção independente.
-Mas na hora de registrar, como vai ser?
-Se a coisa não tiver sido resolvida até lá... eu registro como filha de pai desconhecido.
-Você não acha cruel isso?
-Cruel? E o que o Fábio fez comigo, mãe, foi o que?
-Uma coisa não tem nada a ver com a outra...
-Como que não? Ele me omitiu por meses que ele tinha sido namorado e noivo da Arlete! Eles iam se casar até acontecer aquela tragédia com ela! Dá pra perceber a gravidade disso, mãe? Você tem a noção de que provavelmente ele me encontrou “por acaso” naquele primeiro momento porque queria algo que lembrasse dela e sabia que encontraria em mim essa parte, ainda que simbolicamente? Não acha isso mórbido?
-Eu continuo achando que você tirou conclusões precipitadas demais em relação a tudo isso...
-Como é que eu não poderia concluir essas coisas? Eu não sei se ele ama a mim ou a lembrança que eu trago da falecida... e é isso que me dói. Promete que não procura ele, mãe... promete.
-Tá bom, filha... pode contar comigo. No que depender de mim, ele não fica sabendo da sua gravidez...
CORTA A CENA.

CENA 2: Valéria e Hugo resolvem conversar com Leopoldo e Bernadete enquanto assistem televisão na sala.
-Gente, eu sei que vocês devem estar com sono, mas eu e o Hugo andamos pensando num troço... numa ideia que a gente andou meio que desenvolvendo nesses dias... - fala Valéria.
-É isso mesmo que a Valéria disse. Bem, agora que não é segredo pra ninguém que a gente tá junto... - fala Hugo.
-Pois devia continuar sendo segredo. Onde já se viu trair a memória do seu irmão desse jeito? - repreende Leopoldo.
-Para com isso, Leopoldo! Tenho certeza que o Leo tá abençoando os dois e digo mais: quem é que pode impedir o amor de acontecer? Guarde suas críticas conservadoras pra si, meu querido... eles não precisam de nada disso! - revida Bernadete.
-Gente... eu não quero causar problemas, de verdade. Vocês não precisam se estressar por causa disso... - tenta apaziguar Valéria.
-Deixa, amor... deixa. No fundo o pai sabe que não tem a mínima condição de apontar o dedo... - dispara Hugo.
Bernadete fica intrigada.
-Não entendi... - observa Bernadete.
-Não é pra entender... - desconversa Leopoldo, tenso...
-Bem... a gente vai ou não vai poder falar sobre a nossa ideia antes que vocês subam pra dormir? - pergunta Hugo.
-Claro que vão poder sim, meu filho! Desculpem essa enrolação toda sem necessidade... prossigam. - estimula Bernadete.
-A gente andou pensando em passar um tempo em BH assim que o bebê nascer... assim, claro que não vai ser tão rápido. Vai ser tipo mais ou menos um mês depois do parto. Vai servir como se fosse uma lua-de-mel, só que sem casamento... - explica Valéria.
-E antes que vocês concluam que eu não pretendo casar com a Valéria, pretendo sim, mas é que nosso foco é o bebê, antes de mais nada. Depois a gente pensa nessas burocracias... - complementa Hugo.
-Eu acho justa a ideia. Ainda é uma oportunidade da Valéria matar saudade da terra dela... o que cê acha, Leopoldo? - fala Bernadete.
-Se eu discordar, eu saio vivo daqui? - brinca Leopoldo.
-Ei, pai... não precisa bancar o durão, viu? - revida Hugo.
-Vocês estão certos. Precisam aproveitar os momentos juntos, antes que o pimpolho comece a dar muito trabalho... - fala Leopoldo.
-Então tá tudo bem p'rocês se a gente passar um tempo lá? - pergunta Valéria.
-Claro que sim! - finaliza Bernadete.
CORTA A CENA.

CENA 3: No dia seguinte, Elisabete procura Cristina em sua sala na clínica.
-Espero não atrapalhar seu trabalho, Cristina.
-Não vai. Entre, por favor... fique à vontade.
Elisabete se acomoda e começa a falar.
-Olha, eu realmente espero não estar atrapalhando sua rotina.
-De jeito nenhum, querida... você avisou que vinha. Está tudo certo.
-Bem... sendo assim, eu preciso explicar o motivo que me trouxe aqui...
-Olha... se for pra explicar a natureza do seu relacionamento com o Fábio, você não me deve explicações. Afinal de contas, vocês tem um filho, uma história...
-E somos divorciados. Somos apenas amigos. Você precisa acreditar em mim...
-Não faz mais diferença... eu e ele rompemos e ele nem no país tá mais...
-Você sabe o motivo.
-Sei. Mas prefiro não remoer isso dentro de mim.
-Desculpa falar, Cristina, mas você já fica remoendo muita coisa.
-Como o que, por exemplo?
-O Fábio é meu melhor amigo. Eu sei de tudo o que aconteceu entre vocês porque ele mesmo me conta...
-E o que ele te disse, exatamente?
-Que te ama de um jeito único.
-Qual é a garantia que eu tenho disso? Ele pode afirmar que o amor é por mim com certeza? Porque sempre fico com a nítida sensação de que ele ama a memória da Arlete que eu trago depois do transplante.
-Eu sei, eu sinto que ele te ama de um jeito que nunca amou a mim ou à Arlete. Vai por mim... se ele foi embora do país por tempo indeterminado, foi pra juntar os cacos dele mesmo...
-Será, Elisabete? Tenho minhas dúvidas...
-Me chama de Bete, por favor... e se eu fosse você, não teria dúvida.
-Mas isso nem importa mais. Ele não tá lá nos cafundós de Londres? Então que junte os caquinhos dele por lá...
-Você o ama... não precisa dizer isso em palavras. Seu olhar, sua forma de reagir... até mesmo seu jeito de negar, só mostram que existe amor.
-Pena que isso não baste.
-Só se você não quiser que baste.
-Fica difícil, convivendo sempre com a sombra da Arlete entre nós...
-E quem é que tá criando essa sombra, Cristina? Pensa nisso... bem, eu preciso ir agora, porque meu dia ainda é cheio. Mas pensa em tudo o que eu falei, tá? O Fábio te ama... e tá na cara que você também ama ele...
CORTA A CENA.

CENA 4: Elisabete chega em casa e Maurício fica curioso sobre visita da mãe a Cristina.
-E então, mãe? Como foi, lá?
-Minha intuição de que ela é uma ótima pessoa e simpática se confirmou. Só se defende demais, parece sempre pronta pro ataque... meio que pra esconder que é frágil, sabe?
-Sei, sim... mas me diz: falou sobre o pai?
-Falei. Ela se mostrou irredutível e eu entendo ela. Ela ficou mais insegura do que costuma ser quando soube da Arlete.
-O que não deixa de ser compreensível, mãe... afinal de contas, o pai amou a Arlete por mais de dez anos, antes da tragédia toda, no ano passado... perfeitamente normal que ela sinta esse medo.
-Eu concordo, filho... mas você há de convir comigo que ela não pode simplesmente desconsiderar todas as coisas boas que viveu ao lado do seu pai só por causa dessa descoberta...
-Não é “só por causa”, mãe... eu entendo ela. O pai errou de não ter contado antes. A situação foi se agravando...
-Tem mais uma coisa que eu percebi quando conversei com ela.
-O que, mãe?
-Essa mulher tá grávida.
-Que? Como você sabe disso? Ela te disse alguma coisa?
-Não me disse... e é possível que nem saiba da própria gravidez ainda. Mas eu percebi.
-Como?
-Eu não sei explicar direito... mas é alguma coisa na energia dela. É como se eu quase pudesse sentir no ar, como se fosse um aroma, sutil e insistente, ao mesmo tempo. Cristina tá esperando um filho do seu pai.
-Bem... acho arriscado afirmar a coisa desse jeito. Vai que você se enganou?
-Não costumo me enganar com isso, filho...
-Bem, nesse caso, possivelmente eu vou deixar de ser filho único... depois de mais de vinte anos.
-Eu acho que vou falar isso pro seu pai.
-Ficou doida, mãe?
-Ué, por que não? Se ele é o pai da criança...
-Deixa a Cristina contar, se é que ela realmente tá grávida? Não se mete nisso, mãe... promete pra mim...
-Tá, eu prometo...
CORTA A CENA.

CENA 5: Horas mais tarde, Elisabete acaba esbarrando novamente em Maria Susana durante passeio.
-Maria Susana! Que bom te ver por aqui! E o Miguel?
-Tá com o pai...
-Vocês separaram?
-Recentemente...
-Veja você, faz menos de seis meses que divorciei do Fábio... ah, que cabeça a minha, claro que você sabia disso, você era cunhada da Arlete...
-Você fica engraçada falando assim...
-Nossa, eu achei que pudesse ser levada a sério.
-Ei, não leva a mal o que eu falei, tá? Foi só modo de dizer. Você precisa sair um pouco da defensiva, sabia?
-Engraçado... hoje eu tava falando com alguém que eu percebi que se defendia... e não percebo quando eu mesma faço isso.
-É sempre assim, Elisabete... casa de ferreiro, espeto de pau. Comigo não é muito diferente. Mas sabe no que eu tava pensando?
-No que?
-Que tá um calorão horrível e que a gente podia tomar um sorvete, o que cê acha?
-Acho ótimo!
As duas seguem conversando animadamente. CORTA A CENA.

CENA 6: Patrícia desabafa com Daniella.
-Sabe, Dani... eu realmente não sei como dar um significado novo pra tanta coisa aqui na minha vida...
-Como o que, por exemplo?
-O que o Gustavo significa pra mim, entende?
-Acho que entendo... você quer falar melhor sobre isso? Prometo que vou ouvir sem julgar.
-Eu passei grande parte da minha vida achando que tudo o que mais importava na vida era um grande amor, desses que a gente lê nos romances, vê nas novelas, nos filmes, sabe?
-Vish... acho que tou começando a entender...
-Pois... quando o Gustavo surgiu na minha vida, nós dois ainda éramos muito novos. Nos apaixonamos... e eu sonhei desde o primeiro dia com nossa vida juntos... pra sempre. Aos poucos eu ia esquecendo de quem eu fui, de como era a minha vida antes dele. Quando ele foi embora, eu pensei que ia enlouquecer. Eu só via e sentia um vazio imenso... dentro de mim e à minha volta, sabe?
-Isso é mais comum que você imagina, Pati... você nunca pensou em buscar ajuda?
-Que tipo de ajuda?
-Psicológica, ué. Sabia que procurar acompanhamento de um psicólogo não é sinal de fraqueza? Pelo contrário, é sinal de luta...
-Sempre ouvi que quem vai em psicólogo é gente doida.
-É por causa desses tipos de preconceito que tanta gente adoece, se deprime... sofre sem necessidade de sofrer tanto. Vamos parar com isso, né? Talvez hoje você não precise de um tratamento, mas nunca mais ouse negligenciar a si mesma, tá me ouvindo?
CORTA A CENA.

CENA 7: Mauro recebe uma chamada de vídeo e percebe se tratar de seu filho William.
-Filho! Que bom que ocê ligou! Achei que tinha esquecido do seu velho pai...
-Nunca... é que andei enrolado com muitas coisas por aqui.
-Sei. Não andou se enrabichando por nenhuma inglesinha, né?
-De jeito nenhum. Não ando com pique nem ânimo pra pensar nessas coisas.
-Filho... eu nunca vi ocê falar desse jeito... aquela menina realmente mexeu com seus sentimentos, hein?
-Ela é simplesmente o amor da minha vida. E eu joguei tudo isso fora... por burrice e culpa minha.
-Sabe, filho... às vezes eu penso se a culpa não foi minha. De ter deixado você acreditar naquelas teorias malucas que eu tinha e ainda tenho.
-Deixa disso, pai... você fez o que achou certo.
-E isso custou o seu amor. Eu acho que tenho culpa nisso, sim...
-Melhor não entrar nesse assunto, pai...
-Bem, de qualquer jeito foi bom ocê ter ligado... eu tou me mudando pro Rio dentro de alguns dias, então vou acabar ficando incomunicável por aqui...
-Sem problema...
Os dois seguem conversando. CORTA A CENA.

CENA 8: Daniella espera por Gustavo na saída da clínica e ele se surpreende ao vê-la.
-Dani? Esperando alguém?
-Você mesmo... cê tem uns cinco ou dez minutos pra falar comigo?
-Até vinte se você quiser...
-Eu vim falar sobre a Patrícia...
-Ah, não... o que é que tem ela, agora? Ói, eu sei que vocês são amigas, não me meto nisso, mas daí a falar sobre ela, já é demais...
-Gustavo... me escuta: ela ainda precisa de um pouco mais de confiança. E de ajuda.
-Ótimo... se precisa de ajuda, que procure um psiquiatra.
-Não é tão simples. Você, melhor que ninguém, sabe o quanto ela é sozinha.
-Parte dessa solidão foi ela mesma que cavou.
-Cadê sua solidariedade, sua empatia? Olha, eu sei que você tem seus motivos pra ter algum medo de se aproximar dela, mas ela tá admitindo as fraquezas. Se esforçando pra se tornar uma pessoa melhor. Isso não conta?
-Claro que conta, mas mesmo assim...
-Mesmo assim o que? Tudo o que ela podia ter feito de artimanhas ela já fez. Se aproxima dela, Gustavo... vai desarmado. Acho que é exatamente disso que ela precisa.
-Difícil confiar nela...
-Mas é impossível?
-Bem, impossível não é, mas...
-Então tenta. Não custa nada tentar...
CORTA A CENA.

CENA 9: Elisabete conta empolgada a Maurício sobre o dia.
-Daí a Maria Susana me contou várias coisas que me deixaram totalmente embasbacada, porque eu me identifico por completo, sabe?
-Claro que sei, mãe... é sempre bom quando a gente encontra gente boa assim, né?
-Nem me fala. Eu me pergunto como que eu não percebi antes que pessoa sensacional que ela é. Gente, anos a fio, passando reto, praticamente ignorando...
-Por um lado cê tinha suas razões, mãe... por causa da família dela.
-Mas não era justo, Maurício... ela era esposa do irmão da Arlete. Só isso... e eu coloquei tudo no mesmo balaio. Fui burra? Fui... mas acho que tou começando a aprender a lição... a Maria Susana é incrível, filho. Você precisa conversar com ela, tenho certeza que vocês vão se dar bem!
-Impressão minha ou faz meia hora que, vira e mexe, você volta a falar nela, hein? Nunca vi tanta empolgação assim, mãe...
-O que cê tá querendo dizer, filho?
-Nada não...
Maurício desconfia de empolgação de Elisabete. CORTA A CENA.

CENA 10: Cristina está se preparando para dormir quando seu telefone toca.
-Alô? Oi, Bete... o que manda?
-Então... espero não ter ligado em má hora.
-Tá tudo certo, querida.
-Bem, eu liguei porque eu percebi uma coisa hoje mais cedo, mas não quis te perguntar na hora...
-Pois pode perguntar agora.
-Cristina, cê tá grávida?
Cristina se assusta.
-Eu? Grávida? Mas de onde cê tirou isso, Bete?
-Eu sei quando uma mulher tá grávida. Algo na energia dela se modifica. E eu percebi essa energia em você, enquanto a gente conversava. Acho bom você fazer exame, se não souber de nada ainda...
Cristina fica atônita. FIM DO CAPÍTULO 62.

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