CENA 1: Daniella, ainda perplexa, sacode Gustavo até que ele acorde. Gustavo despera impaciente.
-Poxa, Dani. Quantas vezes eu disse que detesto ser acordado desse jeito?
-Muitas. Mas acho mesmo que a gente precisa ter uma conversa e essa conversa vai ser séria.
-Nossa, desse jeito ocê me assusta.
-Brincadeira, bobo. Só queria te falar que o jantar tá pronto.
-Te conheço, Dani. Tem algo estranho.
-Besteira sua, Gustavo. Só queria brincar um pouco com a sua cara.
-Precisava ser quando eu peguei no sono aqui?
-Ai, deixa de ser amargo, amor! Brincar de vez em quando faz bem, que que há, criatura?
-O que há é que eu tava exausto.
-Ah tá, como se eu ensaiar horrores não fosse nada também, né? Além de eu me matar dançando pelo menos três vezes por semana. Quer mesmo falar sobre cansaço, ó macho alfa?
-Pronto, começou.
Os dois riem.
-Quer um café antes?
-Vou preferir. Até acho melhor porque o gosto da comida fica melhor.
-Eu coloco a água pra esquentar ali. Mas antes me diz uma coisa, se puder me dizer?
-Digo sim. Do que se trata?
-Tava bom o sonho?
-Que? Que raio de pergunta é essa, Daniella?
-É que cê dormiu pesado nos minutos que te deixei sozinho aqui na sala porque tava descongelando as pizzas.
-Sei. Ainda não entendi o motivo da pergunta.
-É que cê tava sorrindo, parecia estar gostando do que via. Presumi que tava sonhando.
-Deve ter presumido errado.
-Será mesmo, Gustavo? Ou será que tem coisas que você não gostaria de me dizer por medo de ser mal interpretado?
-Eu hein, que ideia mais sem pé nem cabeça.
-Será sem pé nem cabeça mesmo?
-É sim.
-Pode me falar, amor. Cê sabe que eu sempre vou me esforçar pra nunca te julgar.
-Dani... não tem nada. Eu juro. Pelo menos eu não lembro de nada.
-Se você diz, eu acredito.
-É pra acreditar mesmo.
-Desculpa se eu fiz a chata, tá? É que eu só queria saber se tava acontecendo alguma coisa...
-Nem que ocê quisesse ia conseguir ser chata. Não precisa se preocupar com o café.
-Não, Gustavo... eu faço questão. Cê tava dormindo tão pesado que eu logo pensei que cê tava era bem cansado mesmo.
-E ainda tou. Mas ocê tá tendo muito trabalho sem necessidade.
-Deixa de bobeira que meu único trabalho foi colocar pra descongelar o que já tava pronto antes.
-Mesmo assim, amor... não tinha a mínima obrigação disso. Deixa que eu preparo o meu café, mesmo.
-Por que cê é tão perfeito assim, Gustavo? Da forma que você foi feito, ninguém mais foi.
-Caramba, e a sagitariana é a sua irmã. Deixa de ser exagerada!
Gustavo vai até a cozinha e Daniella fica desconfiada. CORTA A CENA.
CENA 2: Fábio insiste em conversa com Cristina, que fica desconfortável diante dele.
-Fábio... por favor. Vai embora, cara. É melhor pra nós dois.
-Eu iria se soubesse que é o que você quer de verdade.
-Caramba, viu? Essa temporada relâmpago que cê passou na Espanha não fez nada bem pro seu ego. De verdade.
-Larga de ser julgadora.
-Não preciso lançar mão dos meus julgamentos. Sua postura fala por si só.
-Cristina... por favor, pelo menos uma vez nessa vida, baixa a guarda.
-Pra que? Pra você disparar a sua metralhadora de machismo pra cima de mim? Olha o que aconteceu com a gente quando eu baixei a guarda!
-Engraçado que você é condescendente com os próprios erros e juíza com os alheios.
-Quem você pensa que é pra me tomar desse jeito, Fábio? Você sabe da minha vida o que eu permiti que você soubesse.
-E também sei que esse filho que você carrega aí é meu.
-Importa?
-Claro que importa!
-Não é o que parece. Porque quando foi pra você jogar na minha cara a sua desconfiança, você não poupou latim, consideração e respeito passaram totalmente longe. Delicadeza, então, nem se fala.
-Mas eu sei que você ainda acredita em nós dois.
-Fábio... baixa bem essa sua bola. Mesmo. Vai embora daqui, por favor. Não me obrigue a ser grossa.
-Eu vou. Mas eu volto.
-Faça como quiser, mas me deixe trabalhar.
Nesse momento, Vitório chega e vê Fábio de saída. Vitório procura disfarçar que conversou com Fábio antes.
-Algum problema, gente? - pergunta Vitório.
-Tudo certo. Eu já tava mesmo de saída. - fala Fábio, se retirando prontamente.
Cristina fica sem entender nada. CORTA A CENA.
CENA 3: Na manhã seguinte, durante café da manhã, Vitório percebe que Cristina o encara com desconfiança.
-O que foi, Cris?
-Tou tentando elaborar aqui dentro uma explicação racional pro Fábio ter te tratado com cordialidade ontem à noite.
-Ué... o que é que isso tem demais?
-Ele devia sentir raiva de você. Pensei até que ele fosse querer te bater. Mas não... ele ficou ali, parado. Sem reação, praticamente. Quem visse de fora, pensaria que existe até uma camaradagem entre vocês...
-Credo, Cristina! Acho que você anda vendo seriado policial demais, hein...
-E sei que quando você desconversa assim, tem coisa...
-Para com isso, Cris. Não tem nada.
-Eu acho que tem. E digo mais: vocês estavam a vontade demais pro meu gosto. Vitório... você conversou com o Fábio?
-Não! Claro que não! Que ideia...
-Faltou firmeza. Vocês conversaram. Só tenho medo de saber o que é que foi dito. Agora tudo faz sentido... as suas saídas... era isso.
-Você conclui coisas demais, Cristina. Não viaja.
-Espero que seja mesmo viagem minha, porque já disse que não é pra você se meter.
-Vamos mudar de assunto, por favor?
Cristina segue desconfiada. CORTA A CENA.
CENA 4: Ezequiel, o psiquiatra que acompanha o caso de Giovanna, estimula ela a falar.
-Fala mais pra mim sobre como você se sente?
-Eu não sei exatamente por onde começar.
-Tente, Giovanna. É importante pra fazer ajustes necessários ao seu tratamento. Faça um esforço...
-Bem... o fato é que essa história do diagnóstico do transtorno dissociativo faz todo um sentido.
-É mesmo? Me fala mais sobre isso...
-Sempre senti um conflito gigantesco diante de mim. Mas era um conflito diferente desses conflitos clássicos que as pessoas costumam ter, sabe?
-E como eram?
-Conflitos morais internos. Uma briga feia mesmo. Um lado meu sonhava com uma vida de comercial de margarina, com direito a marido, filho, essas coisas... mas o tempo foi passando e o outro lado tomou conta.
-Por que? Existe algo que disparou isso? Algum trauma?
-Bem, além de eu ter perdido meus pais ainda muito nova, eu fui abandonada pelo meu noivo depois de sete anos, sabe? A gente planejava casar e ele fugiu com a minha melhor amiga. Nunca mais apareceram.
-Nenhuma notícia deles dois, nunca mais?
-Sim. Aquilo ali foi um baque duro demais pra mim. Eu tinha só vinte e quatro anos. E tava sem chão. Foi então que eu decidi ser fria e não me importar com nenhuma dessas convenções.
-Entendi. Fala mais...
Giovanna segue contando sua história. CORTA A CENA.
CENA 5: Daniella está chegando na clínica quando recebe ligação de Patrícia.
-Amiga! Que bom que cê ligou! Como vão as coisas aí em BH?
-Maravilhosas! Eu fiz um bem incrível a mim mesma quando decidi voltar pra cá.
-Que ótimo, mas diz pra mim: seguiu o tratamento por aí?
-Prontamente. Menina, tem cada gato que vai se consultar que eu chego a passar mal com tanta oferta desse mercado!
-Safada!
-Não seria eu se não ficasse toda molhada, né?
-E eu não sei? Sempre assanhada!
As duas riem.
-Tou sentindo ocê meio desanimada, Dani... ocupada demais?
-Antes fosse só isso, Pati... na real eu não tenho certeza que tomei a melhor decisão ao achar de boas levar adiante essa ideia de me casar com o Gustavo.
-Uai, gente... mas ocês não se amam?
-Amor não basta. Ando sentindo que talvez essa ideia seja meio complicada pra nós dois.
-Por que? O Flavinho tem a ver com isso?
-Claro que tem. Acredita que o coitado até demissão conseguiu aqui da clínica pra não ter que encarar?
-Ah não, Dani! Não vai me dizer que se sente culpada...
-Não, culpada eu não me sinto. Mas dá uma dor no peito saber que tudo isso causa sofrimento num cara tão gente boa feito ele.
-Isso é uma maneira de sentir culpa, amiga...
As duas seguem conversando. CORTA A CENA.
CENA 6: Vitório insiste que Cristina desabafe com ele.
-Cris... pode confiar em mim!
-Mas eu confio.
-Será que confia? Não é sequer capaz de admitir pra mim, que sou seu amigo, que ficou abalada de ter visto o Fábio ontem...
-Ai, vai começar com isso outra vez? Me erra, Vitório.
-Vou continuar até você admitir.
-Não consigo mesmo esconder as coisas de você, né?
-Nem que tente. Te conheço faz uma vida.
-Tá certo. A verdade é que eu morro de saudade do Fábio. Ver ele ontem mexeu com os meus sentimentos de um jeito que nem sei explicar direito.
-Eu sabia!
-Satisfeito agora?
-Nem um pouco. Acho que cê tem que fazer alguma coisa a respeito disso.
-Fazer o que? Não tem jeito, Vitório.
-Só se você não quiser.
-Não é uma questão de querer.
-Então deixa eu tomar frente disso que eu resolvo a vida de vocês.
-Vitório, às vezes eu me pergunto se isso é mesmo altruísmo ou ingenuidade. É impossível que você consiga mudar o quadro das coisas, não valeria a pena o seu desgaste com isso.
-Será que não?
-Vitório, vai catar coquinho...
CORTA A CENA.
CENA 7: Giovanna relata ao psiquiatra sobre seus pensamentos conflitantes e confusos.
-Ezequiel... tem um tempo pra me ouvir?
-Senta aí, Giovanna. Tá tudo certo?
-Na medida do possível.
-Alguma coisa que eu possa ajudar nesse momento?
-Ouvir já vai ser de boa ajuda.
-Então pode falar.
-Não quero atrapalhar sua rotina.
-Giovanna, meu trabalho é esse. É atender meus pacientes e você é minha paciente.
-Bem... é que eu ando muito confusa com tudo. Não é de agora. Eu sinto que venho tendo essas espécies de ausências de antes. Mas acho que elas vem intensificando.
-Fale mais sobre isso...
-Meus pensamentos se confundem. Eu me confundo, perco a medida de tempo e espaço. Às vezes me olho no espelho e não reconheço a mulher de quase quarenta anos. Eu me vejo transportada pra outros momentos. Sendo realmente outra coisa. Como se fosse mesmo outra pessoa. Eu fico com medo de mim, medo do que eu posso fazer contra mim mesma ou contra as pessoas nessas horas.
-Como o que, por exemplo?
-Eu sei que tive uma gravidez psicológica. Que nunca estive realmente grávida. Mas nessas horas de surto eu esqueço. E sinto ódios intensos.
Giovanna segue falando. CORTA A CENA.
CENA 8: Idina e José casam no civil e fecham o pub para receber amigos. Idalina parabeniza a nora.
-Querida, parabéns pelo seu pub! Eu nunca tinha vindo aqui antes e achei uma graça!
-O Cantinho Francês é a menina dos meus olhos. É um grande sonho que realizei quando cheguei aqui no Brasil e me ajudou a bancar minhas despesas com as especializações que fiz desde que me mudei pra cá.
-Dá pra sentir que você colocou todo o seu amor aqui, querida. Eu tenho muito orgulho de ser sua sogra. Agora é oficial, ainda por cima.
-Desse jeito eu fico emocionada. Eu que tenho que agradecer, por ter colocado um filho incrível nesse mundo.
-É uma pena que não tenha dado tempo de você conhecer e conviver com a Arlete. Minha filha era tão incrível quanto o irmão...
-Coisas da vida, dona Idalina. Espero que não seja tão dolorido pra senhora...
-A gente se vira como pode.
CORTA A CENA.
CENA 9: Giovanna manifesta sua vontade de voltar ao trabalho em conversa com Ezequiel.
-É isso, basicamente. Eu gosto do meu trabalho, me faz sentir útil diante da vida.
-Sei. Você não deseja parar, certo?
-Exatamente. Ainda preciso estar lá, na agência. Sinto que a Natural High precisa de mim.
-Se sente segura pra aguentar a rotina?
-Sim, Ezequiel. Juro que sim.
-Está certo. Eu libero você para trabalhar durante o dia. Mas você tem de estar aqui antes das vinte e uma horas.
-Aceito. Mas preciso pelo menos voltar com parte da minha rotina.
-Concordo. Vai ser um complemento ao seu tratamento.
-Fechados, então?
-Fechados. Não me decepcione, Giovanna.
CORTA A CENA.
CENA 10: No dia seguinte, Mônica recebe Giovanna com um abraço na agência e a chama para tomar um café.
-Bom te ver aqui. De verdade.
-Por que me chamou pro café?
-Ah, sim... tenho uma novidade quentíssima pra te contar, menina. Sabe a Glória?
-Sei. O que tem a fofoqueira?
-Deixa de implicar com ela, Giovanna. Ela e o Ricardo se acertaram pra valer e vão casar, dá pra acreditar?
Giovanna fica chocada. FIM DO CAPÍTULO 182.
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