quarta-feira, 7 de junho de 2017

CAPÍTULO 177 - ÚLTIMAS SEMANAS

CENA 1: Giovanna, ainda chocada diante das palavras de Valéria, anseia por uma explicação. Valéria, ainda sem saber o que dizer, tenta se justificar.
-Calma, Giovanna... eu sei que é difícil de explicar um trem desses. Mas a verdade é que eu tento esquecer, mas não consigo. Eu gosto d'ocê, Giovanna. Sei que ocê gosta de mim também. Mas ficaram marcas. - fala Valéria.
Giovanna se sente ofendida e começa a chorar.
-Sabe o que mais me dói nisso? É saber que apesar disso ser horrível, você tem razão. Te entendo por isso. É compreensível que você não tenha me perdoado depois de tudo o que aprontei. - fala Giovanna.
-Bem, eu vou deixar vocês conversando sozinhas que eu acho melhor. - fala Hugo, deixando o quarto.
Valéria começa a explicar melhor.
-Giovanna, eu te perdoei. Isso é sério... te perdoei mesmo e foi de coração.
-Então por que ainda me trata desse jeito?
-Se coloca um pouco no meu lugar, como mãe que eu sou: você tá lá na loja, escolhendo que roupas levar, quando de repente a sua amiga, que sofre de transtornos mentais, simplesmente desaparece com o seu filho, que é um bebê de colo ainda. O que ocê ia pensar diante disso?
-Eu ia temer pelo pior, obviamente.
-Entendeu agora a minha situação? Não foi por mal, mas é óbvio que eu fiquei bem assustada.
-Totalmente compreensível.
-Não me leva a mal. De verdade, eu não quis te ofender em momento nenhum com isso, mas ocê há de convir comigo que a coisa mais natural a se pensar diante de uma situação dessas era o que eu pensei...
-Sim, eu concordo plenamente com isso. Também sei que é natural que às vezes a gente fique meio assim, desconfiando das coisas...
-Exatamente, Giovanna. Não foi nada pessoal, mas é que eu já te vi fora de si antes. Lembro até hoje de como ocê fica quando entra em surto. E é claro que eu tive medo que de alguma forma ocê pudesse estar entrando em alguma espécie de surto novo. Desculpa se eu pensei isso. Desculpa se de alguma forma isso te ofende. Mas é que na minha posição, eu acho natural ter medos assim...
-Relaxa, Valéria... eu realmente te entendo, querida. Claro, não vou mentir, me ofendi sim. Doeu pra caramba. Mas eu sabia que acabaria passando por isso depois que iniciei o tratamento.
-Me dá um abraço?
-Claro que sim, sua boba!
As duas, emocionadas, se abraçam. Giovanna torna a falar.
-Vamos tratar de passar uma borracha nisso tudo, né?
-Claro que sim. Sabe, Giovanna... apesar de tudo isso ser algo recente e até inusitado, eu sinto uma amizade verdadeira e genuína surgindo aqui entre a gente.
-Disso eu não tenho dúvida. E sou grata por isso, porque sei que não merecia.
-Besteira. Pra mim não tem esse negócio de merecimento, não. O que existe de concreto são afinidades. E imaginar que lá no começo meu santo não cruzou com o seu...
-Pudera, boba: eu tava em outro momento. Sinceramente, nem eu mesma conseguiria ser minha amiga. Tudo e todos eram ameaças pra mim. Desconfiava até da própria sombra. Esse é o preço que a gente paga por uma vida clandestina...
-Melhor deixar esse papo pra lá...
As duas seguem conversando. CORTA A CENA.

CENA 2: No dia seguinte, após café da manhã, Cristina se prepara para ir trabalhar e Vitório vai atrás dela.
-Tem certeza que é uma boa ideia ir trabalhar?
-E por que não haveria de ser, Vitório? Que besteira...
-É, mas o stress, como é que fica?
-Vitório, cê lembra do que eu combinei com a Daniella?
-Meio a meio. Não disse como seria.
-E cê tá achando que eu ia aprontar uma falseta dessas com a minha irmã sabendo que ela tem os compromissos dela com o teatro e com a dança? Mas nem morta, Vitório! Não seria justo.
-É que eu me preocupo com você...
-Vou ficar bem. Já tenho me estressado menos, confia no que eu tou te dizendo...
-Mas eu sei como tudo isso pode mudar em dois tempos.
-Como assim?
-Vai que acontece algo que te deixe contrariada?
-O que? Cê tá me chamando de controladora ou eu tou viajando demais?
-Sim. Cê sabe que a gente é assim, basta que uma coisa saia do controle da gente que pronto, tá feito o barraco...
-Pior é que cê tá é certo. Mas fica frio. Tá tudo sob controle.
-Até sair do controle.
-Bobo. Confia em mim. Eu preciso ir trabalhar hoje. Foi o que eu combinei com a Dani e eu não posso voltar atrás nisso.
-Promete que não vai estressar?
-Prometo.
CORTA A CENA.

CENA 3: Bernadete desabafa com Nicole sobre sua preocupação com Flavinho.
-Não sei mais o que eu faço pra ver o Flavinho feliz de novo, amiga...
-Eu achei que ele estivesse feliz vivendo aqui, Dete... ainda mais agora que até de mãe ele andou te chamando...
-Mas ele tá pequenininho perto do que era antes. É como se a luz estivesse apagada.
-Tenho notado ele meio desanimado com tudo, mesmo... só não pensei que fosse pra tanto.
-É justamente isso que me preocupa, Marilu. É ver o Flavinho perder o brilho natural. Parece que tá vivendo no automático, sem perspectiva, sem vontade, sem nada... isso é duro de ver num rapaz tão jovem, sabe?
-Será que não é depressão?
-Já cheguei a suspeitar disso. Mas concluí que não. Ele tá mesmo é desmotivado, mas não chega a ser doença.
-A gente pode fazer alguma coisa?
-Eu não sei. Sinceramente não sei. Acho que ele tá sofrendo de amor. Pelo irmão da Valéria, sabe?
-Ah, sim... não sabia que ele tinha uma história com o Gustavo.
-Tinha sim. Foi algo confuso, ele nunca falou muito a respeito com a gente. Mas já vi ele chorar mais de uma vez por isso. Aos prantos, por sinal.
-Pelo menos ele superou de vez o luto pelo Leo...
-Sim. Mas mesmo assim... é como se ele estivesse suspenso. Sem saber pra onde correr...
As duas seguem conversando. CORTA A CENA.

CENA 4: Ricardo surpreende Glória em sua mesa com um pequeno arranjo de margaridas.
-Ai, Ricardo! Que delicadeza! Não acredito que depois de tanto tempo você ainda lembra...
-Impossível esquecer. Seus olhos chegam a brilhar quando cê olha as margaridas...
-Foi de uma delicadeza tocante, Ricardo. Me fez até lembrar um pouco dos nossos velhos tempos.
-A intenção é justamente essa.
-Cê tá falando sério?
-Sim.
-Acho que aqui não é o lugar mais indicado pra gente falar sobre isso, você não acha?
-Tem razão. É por isso que eu pensei na solução e tou te chamando pra almoçar comigo.
-Ai, meu Deus... eu aceito. Mas olha aqui, Ricardo: ou você coloca as coisas bem claras ou não tem jogo aqui. Cê sabe que não tou mais com idade e muito menos disposição pra ficar nesse chove não molha.
-A minha intenção é deixar fluir. Ver onde vai dar.
-Tranquilo. Mas vou eu mesma estabelecer o prazo disso, pode ser?
-Acho justo.
-Maravilha. Já começamos bem. A gente se vê mais tarde. Na lancheria da Josiane?
-Eu pensei naquela do filho do seu Anacleto...
-Cê tá mesmo querendo invadir com artilharia pesada, né? Cê sabe que guardo lembranças de Santa Tereza.
-A intenção é justamente essa.
CORTA A CENA.

CENA 5: Mônica surpreende a todos ao chegar sem se anunciar na agência, de volta de sua viagem. Glória se alegra de ver a amiga.
-Mônica! Cê não disse que tava voltando! - fala Glória, abraçando Mônica.
-Ei, eu também quero abraçar a Mônica, tá? - fala Ricardo.
-Calma, gente. Tem Mônica pra todo mundo, se organizar direitinho ainda tem beijo! - brinca Mônica.
-Ah, mas é sempre assim, não dá pra falar uma coisinha que essa ariranha já fica como? Toda se achando! - segue Glória na brincadeira.
-Meu bem, eu não preciso me achar nem um pouco nessa vida, porque cê sabe... eu já sou! - segue Mônica, descontraída.
-Se tem alguém que pode se achar nesse mundo, esse alguém é a Mônica. Mas conta pra gente, querida... como foi a viagem? - questiona Ricardo.
-Gente, foi incrível. Aprendi muita coisa, muito mais do que eu tinha expectativa de aprender. O grande barato da coisa toda foi justamente isso, porque quando a gente sai do nosso comodismo, dos nossos próprios sensos comuns que todo mundo tem, mas nem sempre admite, a gente começa a entender na prática aquela coisa que a gente repete no automático, que é basicamente o fato de que a gente nunca deixa de aprender coisas novas enquanto vive. Enfim, tudo isso foi enriquecedor pra mim, não apenas profissionalmente, mas principalmente pessoalmente. A gente vai pro exterior esperando por uma realidade muito específica, mas acaba se deparando com outras coisas. Inclusive com a desigualdade, que Às vezes é maior do que aqui... - fala Mônica.
Todos seguem conversando. CORTA A CENA.

CENA 6: Flavinho observa de longe Gustavo animar as crianças. Gustavo não percebe. Flavinho segue observando silenciosamente.
-Ei, Tatiana! Que risinho mequetrefe é esse? Não caprichei no número, não? - pergunta Gustavo a uma das crianças, fazendo cara de tristeza.
-Não! Não fez aquele troço com a orelha. - sugere a criança.
Gustavo faz o que a criança pediu e todas riem. Flavinho observa de longe feliz e ao mesmo tempo entristecido por ter permitido que Gustavo tomasse outro rumo. Seu pensamento ganha voz.
“Eu fui muito burro, gente. Olha pra ele. Gustavo é tudo o que eu sempre quis nessa vida. Tem tudo o que eu sempre sonhei. Ainda por cima é meu melhor amigo... ou pelo menos era. Hoje eu não sei de mais nada. Eu fiquei tão perdido diante de tudo que cometi erros que não sei nem se eu seria capaz de me perdoar. Tive medo. Medo de perceber que eu também tenho preconceitos. Fui covarde demais da conta, gente... não quis encarar o óbvio de frente. Não consegui me olhar de verdade na frente do espelho e agora eu pago por isso. Não posso nem reclamar. A culpa foi totalmente minha. Pensei que o fato de eu ser gay me livrava de ser preconceituoso e eu fui um imbecil com ele. Julguei a bissexualidade dele e agora tou aqui. Sofrendo calado, sem nem chance de poder falar sobre isso porque a vida dele já tomou outro rumo. E eu deixei esse caminho livre, não tenho nem mesmo o direito de reclamar. Tou cansado disso, cansado de tudo. Quem sabe eu deva mesmo largar tudo o que não me faz mais bem...”
Flavinho sai andando. CORTA A CENA.

CENA 7: Nicole vai empolgada conversar com Bernadete sobre uma ideia que teve.
-Dete, vem cá. Eu acabei de ter uma ideia que pode ser sensacional.
-Lá vem bomba.
-Nem falei ainda, poxa!
-E eu não sei que cê sempre vem com ideias mirabolantes quando vem toda empolgada assim? É assim desde que a gente era adolescente...
-Bem, não acho que seja tão mirabolante assim, mas... em todo caso...
-Fala de uma vez antes que eu desista...
-Boba. Vou falar.
-Então anda, Marilu!
-Eu pensei que a gente podia reformar os nossos vestidos de noiva pro casamento aqui em casa...
-Ah, era só isso? Decepcionante, hein? Você já foi mais criativa, amiga...
-Não para por aí, Bernadete. Na verdade, eu pensei em algo mais inusitado.
-Vá em frente.
-A gente trocou de marido, não trocou? Quer dizer... a gente desfez a troca que a gente tinha feito lá em oitenta e quatro...
-Falei que lá vinha bomba...
-Você vai gostar da minha ideia. Pensa comigo: a gente até hoje tem tipos físicos parecidos, certo?
-Sim.
-A ideia é que a gente reforme os vestidos sim, mas o que era meu passa a ser seu e... vice versa. Entendeu?
-Marilu, essa ideia é genial! Adorei, de verdade! É uma maneira divertida e criativa da gente celebrar o casamento e ainda surpreender os dois!
-Tá vendo? Eu sempre digo que não dou ponto sem nó!
-E é mesmo verdade. Adorei essa ideia, Marilu!
-Bora colocar em prática, então?
-Bora!
CORTA A CENA.

CENA 8: Giovanna se oferece a fazer o jantar.
-Valéria, cê comprou champignon? - pergunta Giovanna.
-Sim. - responde Valéria.
-É que eu tou pensando em fazer aquele estrogonofe vegetariano que vocês gostam. Posso assumir o fogão hoje? - pergunta Giovanna.
-Taí... eu tava mesmo morrendo de preguiça de cozinhar. - fala Hugo.
-Vai lá, Giovanna. Aposto que vai se sair bem! - estimula Valéria.
Giovanna vai à cozinha e começa a preparar o jantar. Enquanto se ocupa disso, lembra das palavras de Giovanna desconfiando dela e se sente triste, mas volta a si.
-Calma, Giovanna. Ela tem razões e motivos de sobra pra isso. Não adianta ficar remoendo sem a mínima necessidade essa mágoa. Você nem mesmo devia se magoar, porque fez por merecer... - fala a si mesma.
Giovanna segue concentrada na preparação do jantar para esquecer dos pensamentos. CORTA A CENA.

CENA 9: Cristina segue organizando informações do sistema interno da clínica e acaba lembrando de Fábio. Seu pensamento ganha voz.
“Ai, Deus... será possível que mesmo depois de tudo o Fábio ainda vai ficar voando no meu pensamento feito mosca? Não aguento mais. Já fiz de tudo pra esquecer desse homem, só não fiz simpatia nem unguento. Mas não consigo. O pior de tudo é que eu ainda me arrependo de ter tratado ele da forma que tratei. Mas não posso me arrepender! O errado foi ele! O machista foi ele. Quem duvidou da minha lealdade foi ele. Não, eu não posso recuar. De jeito nenhum!”
CORTA A CENA.

CENA 10: Instantes depois, Flavinho bate na sala de Cristina.
-Entra, Flavinho.
-Atrapalho?
-Nunca. Precisando de ajuda?
-Sim, mas não é nada do que ocê tá pensando.
-Não entendi.
-Eu quero ir embora.
-De novo liberar mais cedo? Olha, eu te libero sim, mas não vai se acostumando porque senão vou ter que descontar do seu salário.
-Não, Cris. Não é isso.
-É o que, então?
-Eu andei pensando muito em tudo. Não vejo outra saída.
-Não tou gostando nadinha desse seu papo. Não tou com uma sensação boa.
-Eu vim pedir demissão.
Cristina se espanta. FIM DO CAPÍTULO 177.

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